Mesmo com arcabouço, mercado vê aumento da dívida pública para quase 92% do PIB em 2032, aponta BC

Dívida bruta do setor público terminou o ano de 2022 em cerca de 73,5% do PIB. Previsão é de aumento de 18,3 pontos percentuais em 10 anos. Os analistas do mercado financeiro estimam que a dívida bruta do setor público, uma das principais formas de comparação internacional quando se fala na capacidade de pagamento dos países, deve atingir 91,8% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil em 2032.
A estimativa dos economistas do mercado financeiro para a dívida brasileira foi divulgada nesta sexta-feira (2) pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, durante reunião com conselheiros do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (IEDI) (veja mais abaixo).
Os dados, que foram colhidos na semana passada pelo Banco Central em pesquisa com mais de 100 instituições financeiras, mostram que os economistas projetam uma alta 18,3 pontos percentuais do PIB no endividamento brasileiro em dez anos.
Projeção do mercado para a dívida bruta brasileira
Reprodução de apresentação do presidente do BC, Roberto Campos Neto
Isso porque, segundo informações do BC, a dívida bruta somou 73,5% do PIB em dezembro de 2022, ou seja, no fim da gestão do presidente Jair Bolsonaro. Esse foi o menor nível em cinco anos. Já em abril, último dado disponível, o endividamento brasileiro havia chegado a 73,2% do PIB.
Entenda o impacto do endividamento público:
Por que isso é importante? A relação entre dívida e PIB é um indicador relevante para o mercado financeiro, interpretado como um sinal da capacidade do país de honrar seus compromissos financeiros de curto, médio e longo prazo. Quanto maior a dívida em relação ao PIB, maior o risco de um calote em momentos de crise.
Além da relação dívida/PIB, os investidores também prestam atenção no ritmo de crescimento do país e nos resultado das contas públicas, entre outros indicadores, para avaliar a chamada “solvência” das nações.
Se há uma percepção de risco maior nas contas públicas, o mercado costuma reagir cobrando uma taxa maior de juros na rolagem da dívida, ou seja, na emissão de títulos públicos pelo governo para pagar aqueles que estão vencendo. E isso se reflete nas taxas bancárias ao consumidor, pessoa física e jurídica.
Arcabouço fiscal
A projeção do mercado financeiro de aumento da dívida brasileira até 2032 é estimada apesar da proposta de arcabouço fiscal, a nova regra para as contas públicas idealizada pelo governo federal, que vem para substituir o teto de gastos.
Entenda o que é o arcabouço fiscal, ponto a ponto
Arcabouço fiscal: como funcionariam as regras se fossem aplicadas a um orçamento familiar
O texto da nova regra fiscal já passou pela Câmara dos Deputados, mas ainda tem de ser avaliado pelo Senado Federal para ter validade.
A equipe econômica tem informado que o arcabouço fiscal visa acomodar os gastos sociais de forma perene, sem que haja descontrole da dívida pública brasileira.
Por meio da PEC da transição, aprovada no fim de 2022, o aumento de despesas de R$ 168 bilhões, envolvendo investimentos, foi autorizado somente para este ano – tempo necessário para a aprovação do arcabouço fiscal.
Em linhas gerais, o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva propõe, por meio do novo marco fiscal, que as contas públicas tenham uma meta de resultado primário. Nos próximos anos, a meta busca um superávit (com receitas maiores que despesas), antes do pagamento de juros da dívida.
O objetivo é zerar o déficit fiscal, estimado para este ano em R$ 136,2 bilhões em 2024, e retomar resultados positivos nas contas públicas em 2025 e 2026. Para isso, o Ministério da Fazenda se apoia, principalmente, na busca por receitas extraordinárias.
Segundo a proposta:
Se as contas estiverem dentro da meta, o crescimento de gastos terá um limite de 70% do crescimento das receitas primárias (ou seja, da arrecadação do governo com impostos e transferências).
Já caso o resultado primário fique abaixo da banda de tolerância da meta, o limite para os gastos cai para 50% do crescimento da receita.
Há também uma banda de crescimento real da despesa primária (acima da inflação), que vai de 0,6% a 2,5% ao ano.
Comparação internacional
Acima de 90% do PIB, a dívida brasileira poderá superar o patamar da União Europeia, das nações emergentes e estar bem acima do estimado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) para a América Latina. As previsões, entretanto, vão somente até 2027 (veja abaixo).
Projeção do FMI para a relação dívida PIB
Levantamento do g1
Também estaria mais próxima do nível da Índia e da China e bem maior do que a Rússia – que tem um alto nível de reservas de petróleo e derivados, resultando em baixo endividamento.
Um relatório do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) recomenda que os países da América Latina e Caribe reduzam sua dívida pública para um patamar entre 46% a 55% do PIB. O objetivo seria aumentar a confiança dos investidores e possibilitar a redução da taxa de juros, com efeitos positivos sobre o nível de atividade e sobre o emprego.
Posição do Tesouro Nacional
No mês passado, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, admitiu que a dívida brasileira pode superar o patamar de 80% do Produto Interno Bruto (PIB) ao fim do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2026 – mesmo com o arcabouço fiscal.
Ele também avaliou, naquele momento, que a dívida brasileira não precisa estar no mesmo patamar dos emergentes porque há “diferenciais importantes” na economia brasileira, como praticamente ausência de dívida em dólar e mercado financeiro doméstico desenvolvido, entre outros.
“É difícil falar sobre isso, é uma megadiscussão. A Índia tem divida maior do que a nossa, é um país também em desenvolvimento. Cresce bastante, tem uma trajetória estável de dívida, e segue o jogo. Comparar o Brasil com a América Latina? O Brasil é mais comparável com a Índia ou com o Peru?”, questionou o secretário, em abril.
Veja abaixo as estimativas do Tesouro para o comportamento da dívida nos próximos anos.
Projeções do Tesouro Nacional para a dívida/PIB
Secretaria do Tesouro Nacional
Segundo o Tesouro Nacional, suas estimativas indicam que, após a aprovação do arcabouço fiscal pelo Congresso Nacional, a dívida se estabilizará abaixo de 80% do PIB até 2026 e continuará sua trajetória queda nos anos seguintes.

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