Queda maior da Selic e juros reais baixos
A taxa real de juros da economia brasileira deve cair ainda mais, estimou a Instituição Fiscal Independente (IFI) nesta segunda-feira (14). Em setembro, estava em 1,3%, e a tendência é cair mais, em função de novos cortes esperados pelo Banco Central na taxa Selic. A longo prazo, estima-se que convergirá a 3,5% ao ano.
“A trajetória bastante favorável esperada para a inflação nos próximos trimestres sustenta essa expectativa”, aposta o diretor-executivo da IFI, Felipe Salto, na carta de apresentação do Relatório de Acompanhamento Fiscal (RAF), editado mensalmente com avaliações conjunturais e atualizações para os cenários tanto otimista quanto pessimista, levando em conta as projeções como PIB, inflação e taxa de juros, entre outras.
O documento da IFI diz que a redução de juros não é um movimento apenas brasileiro. “Os bancos centrais ao redor do mundo estão reduzindo juros para estimular a atividade econômica dos países”, destacou Salto. Para ele, a manutenção de juros reais em níveis historicamente baixos depende de uma coordenação eficiente entre as políticas monetária e fiscal.
Como juros e inflação são dois índices altamente interligados, o relatório afirma que “as expectativas inflacionárias abaixo da meta criam condições para que o ciclo de queda da taxa Selic nas próximas reuniões do Comitê de Política Monetária (Copom) tenha continuidade, de forma a prover estímulo à atividade econômica”.
Num cenário de deflação, em boa parte motivado pela redução do preço de alimentos e bebidas, a inflação ao consumidor acumulada em 12 meses passou de 3,43% em agosto para 2,89% em setembro.
As famílias mostram certa recuperação na capacidade de consumo no comércio varejista (3,57% nos últimos 12 meses). Porém, o setor de serviços tem receita praticamente estagnada, e indústrias operam com alto grau de ociosidade.
Com isso, o PIB deve ter subido cerca de 0,2% no terceiro trimestre e, por conseguinte, o índice não deve passar de 1% em 2019.
Cenários
O RAF é composto por três seções: contexto macroeconômico, conjuntura fiscal e Orçamento. Na primeira delas, um olhar mais atento à atividade econômica mostra que a confiança de empresários e consumidores no governo do terceiro trimestre (julho, agosto e setembro) melhorou em relação aos três meses anteriores, mas não voltou aos índices registrados no primeiro trimestre após a posse do governo Bolsonaro.
De acordo com o relatório, o que caracteriza essa redução na confiança é a desaceleração no crescimento econômico global e a lenta recuperação do mercado de trabalho.
A boa notícia é que, segundo a avaliação da IFI, a taxa de desemprego vem recuando, ainda que lentamente. Ela variou de 13,1% em abril de 2017 para 12,3% em janeiro de 2019, sendo de 11,9% em julho e 11,8% em agosto, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad Contínua).
“Essa taxa é 0,3 ponto percentual abaixo da observada no mesmo período do ano anterior. Mas o contingente de desocupados na economia ainda é considerado relativamente alto: 12,5 milhões de pessoas”, diz o RAF.
Na avaliação dos economistas da IFI, a situação segue desfavorável para a criação de empregos formais por causa das incertezas que cercam o cenário econômico e da contenção de custos praticada pelas empresas.
Os economistas lembram que a criação de empregos na economia tem se concentrado em setores ligados à informalidade, o que é ruim para a arrecadação de tributos que incidem sobre a folha de pagamento das empresas, como PIS e Cofins, afirma o documento.
Conjuntura fiscal
A IFI criticou como “muito difícil” a estratégia do atual governo de promover o ajuste somente pelo lado das despesas, principalmente tendo em vista a rigidez da despesa pública no Brasil. O documento prevê que o governo terá de lançar mão de medidas que elevem as receitas, de forma que o ajuste represente uma combinação de medidas.
“Além do crescimento da arrecadação, dependente da recuperação da economia, uma revisão de desonerações fiscais pode ser necessária”, sustenta o RAF.
Ao avaliar a conjuntura fiscal, a IFI destacou que as despesas com o pagamento de benefícios previdenciários aos trabalhadores da iniciativa privada (8,3% do PIB) e os gastos com pessoal (4,3% do PIB) junto com os encargos sociais tiveram ritmo de crescimento acelerado na despesa total de agosto (que soma 18% do PIB). Já as despesas discricionárias, que incluem investimentos públicos e gastos de custeio da máquina pública (principalmente saúde e educação), sofreram forte redução no período (17,2%).
“Isso evidencia a baixa qualidade do ajuste fiscal ora em curso”, condena o documento. Para os analistas, o ideal seria que o governo conseguisse avançar numa agenda de reforma fiscal que corrigisse a dinâmica de despesas obrigatórias do Orçamento. Eles lembraram no RAF que a literatura econômica recomenda a preservação do investimento público em momentos de ajuste pelo lado do gasto.
A reforma da Previdência está neste contexto porque o ritmo de aumento do gasto com o setor é muito maior que o dos investimentos. “Os pagamentos de aposentadorias e pensões tenderão a pressionar cada vez mais o Orçamento público em caso de não aprovação de reformas que corrijam a atual dinâmica dessas despesas”, alerta o IFI no texto publicado na segunda-feira.
Orçamento
A edição do RAF lembra que a Instituição Fiscal Independente alertou nos últimos dois relatórios para erros de cálculo do governo sobre, por exemplo, o gasto com pessoal. A correção desses dados confirmou que as despesas previstas pelo governo estavam possivelmente superestimadas. Além da redução das despesas obrigatórias em R$ 6 bilhões, o governo corrigiu a previsão das receitas líquidas em R$ 6,4 bilhões, em razão de uma expectativa de maior recolhimento de receitas administradas.
Como resultado das novas estimativas, o contingenciamento está em R$ 21,8 bilhões e equivale a 16% do gasto discricionário da União.
Fonte: Agência Senado